sexta-feira, junho 22, 2007

A agulha perfura cuidadosamente a epiderme. Arbitrariamente, sem pedir licença, vai rasgando essa fina camada que separa o interno puro e límpido, do externo empoeirado, bacterizado. Furos nas pernas, nos ombros, nas costas, na cabeça, na pélvis. Furos que não doem.
Os olhos que se fecham, o corpo que relaxa e que esquece do mundo ali em baixo, do lado de fora da janela. E as agulhas e os furos e o fogo. A brasa sem piedade que aquece até o quase insuportável, a vermelhidão, o estupor e, enfim, o alívio. E o ser-humano ali em frente, estendido na cama alva, tão frágil, tão fortaleza, tanta vida, tanta fragilidade...
As lágrimas e o clima doentio que, por vezes, no início, obscurecem a sala tão clara e arejada, transformam-se logo em suspiros e sorrisos agradecidos de quem já não sente mais a dor. E as conversas de comadres lado-a-lado, maca-a-maca, dor-a-dor já livraram muita gente da depressão e dos pensamentos de quem quer matar-se.

Um comentário:

Leonel Camasão disse...

Consegues ser autobiográfica sem ser pedante (como naqueles textos que apagou e não deixou-me ler).
Beijos de São Chico