Eu voltava para casa em um ônibus
– este transporte de gado, bucólico, cheio de bois cansados que seguem a matadores
– e na minha frente havia uma velha torta comendo pipoca. Alguma coisa tinha
torcido a cara dela. O tempo, o vento, uma doença, um marido machão. Com a boca
localizada no canto inferior esquerdo do rosto ela mastigava e mastigava e
mastigava; uma pipoca atrás da outra. Um dos seus olhos também era repuxado. Dava
pra ver um pouco da parte vermelha. De repente ela me surpreendeu vidrada em
sua imagem. Disfarcei muito mal enquanto pensava quem a amava, quantos filhos
havia posto no mundo, de quantos homens havia partido o coração, o que a
emocionava. Mais uma espiada. Ela tinha
um jeito caricato de velha carrancuda, mas estava disfarçada com roupas
normais. Usava uma blusa que me fez lembrar uma tia, talvez a mim no futuro. Desci.
A velha torta ainda mastigava pipoca.