quinta-feira, abril 30, 2009

Noite de estrelas

"Arde na terra a solidão da lua
Iluminando meu olhar perdido
Entre campinas, abismos, chapadas...
Meus olhos queimam a última lembrança
Como fogueira em noite de estrelas
Me deito só, com vista para o mundo
Calando fundo meus sonhos, minhas queixas
Mas alço vôo em busca de teus passos
Piso descalço na terra do teu corpo
Suave passo, suave gosto, cheiro de mato
Meu braço laço, te lanço em segredo

Vem ser meu canto, meu verso, meu soneto
Vem ser poema no árido deserto
Serei oásis, silêncio, festejo
Serei sertão nas horas de aconchego..."

~Roberto Mendes/ Ana Basbaum - (Maria Bethânia)~
Todos os dias tento dormir
antes que a noite chegue e com ela a vontade de escrever
e a louca lembrança do meu mais doce querer
tema de todas as minhas poesias
dono das mais constantes lembranças
entre um momento e outro dos meus dias
sempre que meu coração pega minha mente distraída
Mal sabe ele que ela também pensa em ti
Mais triste que lembrar de alguém sempre que toca uma música triste, é não ter de quem lembrar.

sexta-feira, abril 24, 2009

Relicário

"É uma índia com colar
A tarde linda que não quer se pôr
Dançam as ilhas sobre o mar
Sua cartilha tem o A de que cor?

O que está acontecendo?
O mundo está ao contrário e ninguém reparou
O que está acontecendo?
Eu estava em paz quando você chegou

E são dois cílios em pleno ar
Atrás do filho vem o pai e o avô
Como um gatilho sem disparar
Você invade mais um lugar
Onde eu não vou

O que você está fazendo?
Milhões de vasos sem nenhuma flor
O que você está fazendo?
Um relicário imenso deste amor

Sobe a lua porque longe vai?
Corre o dia tão vertical
O horizonte anuncia com o seu vitral
Que eu trocaria a eternidade por esta noite

Porque está amanhecendo?
Peço o contrario, ver o sol se por
Porque está amanhecendo?
Se não vou beijar seus lábios quando você se for

Quem nesse mundo faz o que há durar
Pura semente dura: o futuro amor
Eu sou a chuva pra você secar
Pelo zunido das suas asas você me falou

O que você está dizendo?
Milhões de frases sem nenhuma cor, ôôôô...
O que você está dizendo?
Um relicário imenso deste amor

O que você está dizendo?
O que você está fazendo?
Por que que está fazendo assim?
...está fazendo assim?"

~ Relicário - Nando Reis ~

quinta-feira, abril 23, 2009

Aula de monografia

Estou pensando em algo grande,
muito grande.
Quase não cabe em mim.


Pra onde vão as frases perdidas?
Queria saber
Perdi boas frases por lá.


Quantas palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras, palavras...


E
.S
..T
...O
....U
.....C
......A
.......I
........N
.........D
..........O


Saudades do menino
..............niño

quarta-feira, abril 22, 2009

Eu te achei lindo desde sempre - este sempre não é de sempre, mas como sempre não se pode medir, uso o sempre que se refere a você em mim -, lindo por dentro e por fora.
Quando enfim o teu sempre começou em mim eu ainda pedia para as coisas passarem devagar pelos ponteiros do relógio para que eu não perdesse o controle delas. Todos ao meu redor avisavam-me do risco que há em correr. Porém, a sensação do vento batendo no rosto era tão boa que larguei as rédeas e, a galope, fomos longe, longe...
Chegastes num momento em que havia um buraco também em mim, isso, acho, nunca te contei, e nisso pequei eu na mesma proporção que tu. A tranqüilidade em estar nesse lugar de paredes coloridas foi a tua presença nele que me ajudou a ter. E você me mostrou o Cruzeiro do Sul, no céu e em mim. E disso eu nunca vou esquecer (gostosa coincidência para nós, dois garotos latino-americanos, sem dinheiro no bolso e sem parentes importantes).
Tenho economizado os sabonetes cor-de-rosa que você me deu e ainda não arrumei a cortina que não deu tempo de você arrumar pra mim. Não sei por que faço isso, mas há lembrança e saudade de ti em cada página lida nas tardes silenciosas, na mesa do café e no travesseiro virado para o lado que dormem os mortos.
Mas eu ainda não sei o que fazer com os sabonetes, meu neném. Eu não sei o que é o amor, e nem você.

sexta-feira, abril 17, 2009

O Centro da cidade

Desde que seu pai a deixou andar sozinha à noite pela primeira vez, tinha uma visão muito romântica do Centro da cidade. Percebia o silêncio e as luzes dos postes davam às ruas ares de um leve alaranjado mal iluminando o breu. Gostava especialmente de uma praça em que casaizinhos namoravam à moda antiga. Caminhava reparando a calçada, as pessoas nos bares e os recepcionistas nas portas de hotéis. Criava fantasias sobre o que havia no fundo escuro dos portões que passavam despercebidos na agitação do dia. Onde estaria o dono desse carro estacionado sozinho nessa rua onde tudo está fechado? As noites de inverno eram ainda mais especiais. Saia de casa vestindo um sobretudo xadrez para poder caminhar com as mãos no bolso e se sentir numa cidade européia.
A magia nunca passou, mas depois de crescida aqueles caminhos que antes fazia por gosto, viraram rotina obrigatória. Continuava reparando nas calçadas, mas fazia isso inconscientemente. Conhecia cada pedaço de concreto rachado. Logo tornou-se inevitável não dar-se conta de que nem sempre era inverno. Ela agora tinha mais medo de andar a esmo por aí. Havia pedintes e garotos drogados em cada quarteirão. Já não sentia mais vontade de desvendar portões e becos. E as baratas um dia vão dominar a cidade. Todas as noites as bichanas passeiam por aí sem o mínimo de acanhamento. Eu bem que tenho avisado, mas ninguém me dá ouvidos.
O Centro ainda inspirava-lhe contos diários que ela continuava nunca escrevendo. Porém, agora as histórias não escritas passavam do discurso poético ao suspense. Elas estão tomando conta disso aqui e um dia nos expulsarão. Tinha certeza disso.